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(íntegra da entrevista publicada em 21JUL2008)


JORNAL DO DIA
ENTREVISTA DA SEGUNDA
Página C1

Data publicação: 21 de julho de 2008
Entrevistado: Rodson Willian Barroso Juarez



Rodolfo Juarez


“A INFLAÇÃO É UM MAL QUE PREJUDICA RICOS E POBRES”

A afirmação é do economista Rodson William Barroso Juarez, mestrando em desenvolvimento regional pela Unifap e um analista da conjuntura da economia mundializada que coloca os paises numa teia que conecta a economia mundial misturando o bem e o mal que a sociedade carrega.

Rodson William Barroso Juarez é economista, especialista em eco-eficiência na produção, mestrando em Desenvolvimento Regional pela Universidade Federal do Amapá (UNIFAP). Nasceu no dia 21 de julho de 1982, em Macapá/AP. Tem como projeto de curto prazo a finalização do mestrado de Desenvolvimento Regional na Universidade Federal do Pará, com foco no meio ambiente e desenvolvimento sustentável onde realiza pesquisas para tratamento acadêmico e profissional estando com estudo avançado sobre o processo de mineração em Pedra Branca do Amapari. A longo prazo projeta contribuir para a formação de políticas públicas no Estado do Amapá e para o desenvolvimento econômico regional, de meio ambiente e construção de conhecimento em instituições de ensino superior. Crítico do modelo atual que o Brasil vem adotando para o desenvolvimento nacional e estudioso dos parâmetros que servem de referencia para a mundialização do comércio e do relacionamento internacional a partir dos meios de produção. Rodson Juarez recebeu a reportagem do Jornal do Dia em seu gabinete de trabalho onde concedeu a seguinte entrevista:



JD - O mundo, já faz algum tempo, está preocupado com os riscos da estabilidade econômica, o que está acontecendo?
RJ - Aumento dos preços ao consumidor, crise do petróleo, crise do mercado imobiliário no Estados Unidos e o anseio global dos impactos negativos nos mais diversos mercados, crise no setor de alimentos, entre outros fenômenos econômicos acabam por chacoalhar a dinâmica social de muitos países por todo o mundo. Discussões antigas sobre o modo de produção capitalista e modernas aspirações sobre sustentabilidade e meio ambiente aquecem a busca por respostas que apresentam seus resultados no dia-a-dia do orçamento familiar.

JD - Quais as principais justificativas para essa preocupação?
RJ - O mundo globalizado, nas mais diversificadas esferas, seja cultural ou economicamente, com os tempos acelerados de produção e comunicação, combinados ao entrelaçamento de políticas econômicas dos estados-nação faz com que qualquer mudança político-social, com os devidos efeitos na economia, provoquem um efeito “dominó” nas economias relacionadas. Tal encadeamento mundial deixa apreensivo qualquer país que faça parte dessa trama, estando este na maresia, seja ela calma ou turbulenta.

JD - O preço do petróleo, que não pára de subir; ou a crise dos alimentos, que não pára de crescer; qual atacar primeiro?
RJ - O entendimento de que os preços dos alimentos sofre influencia direta e proporcional do preço do petróleo, uma vez que este representa grande parte na composição do preço final através da logística de distribuição do bem de consumo (como combustível dos navios, caminhões e de máquinas agrícolas, por exemplo), nos leva à tendência de combate ao preço da fonte de energia mais consumida em todo mundo. Mas a política de preços do combustível fóssil perpassa pelas rais da democracia e nacionalidade dos países detentores das principais reservas naturais desse “ouro negro”, servindo de meio de especulação política e financeira.

JD - As conseqüências mais graves serão sentidas nos países pobres, em desenvolvimento, ou nos países ricos?
RJ - É evidente que os países “desenvolvidos” possuem melhores condições de contornar as crises financeiras através do uso dos recursos produtivos instalados de seus parques industriais, relacionados a uma política econômica eficaz para tal. Os países com desenvolvimento tardio, por outro lado, precisam se antecipar às crises e planejar a condução dos possíveis impactos globais, o que é muito raro de se observar. Cenário favorável ao colapso de uma economia.

JD - O que resta para os dirigentes dos países em desenvolvimento, como o Brasil, fazerem?
RJ - A resposta é complexa e envolve o cerne da dinâmica interna de cada país. Não existe uma receitinha de bolo. Cada nação detém sua particularidade inalcançável pelo positivismo das explicações dos economista neo-clássicos. Mas medidas como austeridade fiscal, fortalecimento da indústria nacional, política monetária saudável, abertura controlado ao mercado internacional, regulação da economia sem contaminação da territorialidade hegemônica, e o combate ao vírus das países acumulativos de poder burocrático, a corrupção.

JD - Essa “quase crise” generalizada já está afetando o Brasil?
RJ - Diria que é uma crise o que observamos na economia globalizada atual, com reflexos inclusive no Brasil. Quando temos uma política nacional local de diversificação da matriz energética (etanol) criticada pela União Européia, sob o pretexto da elevação dos preços dos alimentos em escala mundial; quando temos uma diminuição na demanda agregada de nosso principal importador (EUA) de diversos bens de consumo; o aumento dos preços dos alimentos através do aumento do preço do barril do petróleo, diminuindo o poder de compra do orçamento familiar do brasileiro. Tudo isso és reflexo da atual conjuntura da economia global em crise.

JD - Se está falando muito na volta da inflação. O que há de real nesse falatório?
RJ - É fato observado pelo Banco Central que os índices que medem os preços brasileiros indicam aumento geral dos preços, nas mais diversas atividades econômicas. A alimentação não pára de ficar cada vez mais cara desde o último trimestre do ano passado. Aluguéis e produtos industrializados também impulsionam os índices. Mas tal fato pode estar relacionado com a comparação do maior controle da inflação observado no Brasil, ocorrido em 2006, com 3,14 % (IPCA a.a.), abaixo da meta para o ano (4,5%). Em 2007, apesar de apresentar relativo aumento no final do ano, também fechou abaixo da meta com 4,46%. Mas o aumento contínuo nos preços dos alimentos ameaça a harmonia.

JD - Há diferença entre essa inflação potencial e a inflação que dominou o Brasil, principalmente na década de 80?
RJ - Claro, assim como uma economia nacional se difere de outra, no tempo também acontece o mesmo. Uma economia passada não é a mesma da atual. No Brasil de 1983, com uma taxa de 211% de inflação anual, a crise era na produção e na conjuntura monetária (crise com o FMI). Atualmente, além das variações nos preços do petróleo, a questão gira em torno da expressiva oferta de crédito no Brasil, com uma indústria fortalecida, mas ameaçada pela taxa de câmbio reduzida que fomenta as importações. Estamos melhores que antes, mas ainda temos muito a planejar.

JD - O que fazer para domar esse “dragão”?
RJ - O fortalecimento da produção agrícola local, política de preços de combustíveis, austeridade fiscal, desburocratização para a produção de bens duráveis (com responsabilidade ambiental), proposta de novas alternativas para a matriz energética (fomento ao etanol brasileiro), controle para a concessão de crédito, controle dos spreads bancários são algumas propostas de ações para um planejamento pró-ativo.

JD - O modelo econômico adotado no Brasil contribui para a vulnerabilidade ou é um paredão contra a inflação?
RJ - Não existe um paredão eficaz para dominação dos índices de preços. O modelo adotado pelo Brasil se reproduz em muitos outros países emergentes e em desenvolvimento. Uma proposta ideológica poderia servir melhor ao que se busca hoje para o conceito de desenvolvimento, mas a praticidade e aplicação não se justificariam num cenário globalizado e na trama atual, deixando as economias nacionais vulneráveis às crises sistêmicas, como a atual.

JD - Como a economia de um Estado, como o Amapá, é afetada pela inflação?
RJ - Nessa trama globalizada é muito improvável que um estado membro de uma federação que faça parte de tratados e acertos econômicos não observe as decisões e transformações nessa teia. O Amapá, com menos de 10% do PIB oriundo da produção agropecuária, recebe alimentos de diversos centros produtivos e observa uma das cestas básicas mais caras e uma participação maior da variável combustível para a formação dos preços (por causa dos fretes Ro-ro).

JD - O que deve fazer o controlador do orçamento doméstico para minimizar os efeitos da inflação?
RJ - O controle na demanda por crédito, principalmente através de cartão de crédito, diminuindo o pagamento de juros, além de pesquisas de preços na hora da compra rotineira em supermercados, fazendo uma opção pelos preços e estabelecimentos que pratiquem os menores preços. Não há necessidade de se estocar alimentos não-perecíveis, como na década de 1980, mas a pechincha, velho hábito brasileiro, ainda é eficiente para contenção de custos familiares. Outras opções sáo relativas aos hábitos diários, como utilização de energia elétrica, água, telefone e transporte, sendo indicado a opção pelo transporte público (onde é eficiente).

JD - Há mesmo a possibilidade da volta da inflação nos índices que foram registrados na década de 1980?
RJ - É possível, mas improvável. A conjuntura é outra. O Brasil é diferente, mais maduro e a população está mais esclarecida e “gato escaldado tem medo até de água fria”. A atual tendência inflacionária já despertou ações para preparação e contenção do aumento dos preços, evidenciando que a realidade é diferente: pagamento da dívida externa, produção em crescimento tímido, mas contínuo, moeda forte, entre outros indicadores. Não devemos nos alarmar a esse ponto.

JD - A inflação prejudica mais o rico ou o pobre?
RJ - A inflação é um mal que prejudica ricos e pobres, mas como sempre, a renda diminuta das classes mais baixas é mais afetada pela alto dos preços, principalmente quando o aumento é observado nos produtos alimentícios, que consome em maior peso os salários.

JD - Há quem ganhe com a inflação?
RJ - Há quem ganhe, mas ganha pouco, quando muitos perdem ou ganhem menos. Os bancos continuam lucrando com a elevação dos juros, pela existência do risco de inadimplência. Alguns fornecedores de alimentos, em casos extremos de crise de abastecimento, cobram o ágio para oferecer a garantia ao consumidor e a rapidez no atendimento.

JD - As “vacinas” que o povo do Amapá não pode deixar de adotar para enfrentar o “dragão”?
RJ - As mesmas medidas para o controle do orçamento familiar, restringindo a contração de débitos ofertados por financeiras (empréstimos) e a pesquisa de preços. Mas vale lembrar que não existe vacina 100% eficiente para enfrentar um dragão, que não é imaginário, mas as medidas eficazes são macroeconômicas, deixando as medidas individuais para mera adaptação a tempos de alta nos preços.

JD - A sustentação da economia amapaense está firmada sobre que “pilares”?
RJ - O que se observa como diretriz atual para o desenvolvimento econômico efetivo é o apoio ao empreendedorismo. Mas a falta de um planejamento de desenvolvimento econômico consistente, com apresentação de instrumentos econômicos e administrativos eficazes, deixa a política econômica local desnorteada, sem um “pilar” essencial que se possa descrever, senão a economia do contra-cheque, que movimenta o mercado local (aumento dos gastos públicos).

JD - Quando um plano de desenvolvimento é mais importante? Em uma economia estável ou em uma economia com cenário inflacionário?

RJ - Um planejamento de desenvolvimento é essencial para a execução de uma saudável política econômica, contando com ações estruturantes e com artifícios para tornar o desenvolvimento duradouro e sustentável. Mas é óbvio que numa economia estagnada, com ocorrência de inflação, a importância de um planejamento aumenta, significando a possibilidade de recuperação econômica, a saída da recessão.

JD - O Amapá é uma unidade federada que tem o seu modelo econômico fortemente apoiado pelo extrativismo mineral. Isso é bom ou ruim?
RJ - No caso específico do Amapá, em toda a história de exploração mineral, o assunto foi tratado de forma irresponsável, com pouca exigência para instalação de mineradoras e exploração do minério local. A implementação de políticas públicas habitacionais, segurança, saneamento, saúde e educação nunca foram eficazes para a garantia dos direitos fundamentais, mostrando que a política estadual para a mineração pode ser melhor trabalhada. Do jeito que está podemos considerar que o cenário é ruim. Poderia ser bom.

JD - O Amapá, além de suportar as turbulências nacionais e mundiais precisa continuar crescendo. Uma equação como essa é possível?
RJ - Questões essenciais como produção agropecuária, silvicultura, mineração com fixação de capital, pesca entre outros, com responsabilidade sócio-econômica e ambiental, sem esquecer a pulsante questão da valorização da política de meio ambiente em todo o Brasil, com ênfase na região amazônica, pode ser considerado como maneira de equalização. Não podemos deixar de considerar o desenvolvimento local para que seja enquadrado num desenvolvimento regioal e mundial, com suas respectivas turbulências.

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